"Ser marxista é, antes de mais nada, ser anticapitalista, ou seja, lutar pela construção de uma sociedade sem classes, que suprima a exploração do homem pelo homem e a propriedade privada dos grandes meios de produção, criando condições para que as relações entre os homens sejam fundadas na solidariedade e não no egoísmo do mercado. Claro, ser marxista não é repetir acriticamente tudo o que Marx disse. Marx morreu há cerca de 120 anos e muita coisa ocorreu desde então. Mas, sem o método que ele nos legou, é impossível compreender o que ocorre no mundo. Ele nos disse que o capital estava criando um mercado mundial, fonte de crises e iniqüidades, e nunca isso foi tão verdadeiro quanto no capitalismo globalizado de hoje. Falou também em fetichismo da mercadoria, na conversão do mercado num ente fantasmagórico que oculta as relações humanas, e nunca isso se manifestou tão intensamente quanto em nossos dias, quando lemos na imprensa barbaridades do tipo 'o mercado ficou nervoso'." (Carlos Nelson Coutinho)

terça-feira, 1 de maio de 2012

A NOVA POLÍTICA ECONOMICA



O fracasso da primeira experiência de construção do socialismo deveu-se a dois fatores: o primeiro foi a ausência de democracia, e o segundo foi a excessiva burocratização do Estado e da economia, resultado da completa estatização da economia, pois ao invés de socializar a propriedade dos meios de produção, os bolcheviques a estatizaram.

Durante a Guerra Civil Russa(1918-1921), os bolcheviques buscaram construir o socialismo por decreto, estabelecendo a completa estatização da economia e o sistema de requisições forçadas de todo excedente agricola. Era o chamado "Comunismo de Guerra", que acabou promovendo a ruptura da aliança operário-camponesa. Os camponeses estavam dispostos a pagar um tributo à revolução (em percentagem da colheita), porque não queriam perder suas terras, permitindo uma restauração czarista, mas não queriam entregar todo o excedente agrícola, arbitrado segundo critérios extorsivos pelos agentes do poder soviético vindos da cidade.

O resultado foi a eclosão de várias revoltas no campo, sufocadas brutalmente pelo Exército Vermelho, e a fome que tomou conta do país, pois o campesinato deixou de produzir.

A NOVA POLÍTICA ECONOMICA

"O socialismo não pode ser imposto por decreto: é um processo em desenvolvimento". (Salvador Allende) 


Felizmente os bolcheviques corrigiram esse erro ao estabelecer a Nova Política Economica, cuja sigla em inglês era NEP. Uma economia mista, onde o mercado e a planificação da economia coexistem, com a propriedade coletiva e estatal sendo implementada nos setores estratégicos, enquanto a pequena e média propriedade privada continuava funcionando em outros setores, especialmente na agricultura, sobre a regulação do Estado soviético.

A princípio foi considerada por Lenin como um "recuo estratégico", pois assim como a revolução internacional recuara, também os bolcheviques recuariam, até conjunturas mais favoráveis, mas ordenadamente, isto é, mantendo o monopólio político. A NEP teve excelentes resultados imediatos. Sociedades tecnológicas rudimentares, onde a força de trabalho tem papel central, podem, vantajosamente, recuperar, com rapidez seus níveis de produção, desde que garantido um mínimo de "paz social". A NEP assegurava este mínimo e a imensa Rússia rural reagiu positivamente. A fome foi vencida. O racionamento foi suspenso. Já em 1924-1925, os índices de produção de 1913 eram alcançados e ultrapassados.

O governo ampliou as concessões: relaxou o controle dos preços, reduziu impostos, ampliou o período do arrendamento de terras e da contratação de mão-de-obra, estimulou a liberdade comercial. Assim, a NEP acabou se tornando o caminho para a construção do socialismo, após ter sido teorizada pelo revolucionário marxista Nikolai Bukharin(foto), deixando de ser tida como um recuo, para tornar-se uma política estratégica de aliança de classes do proletariado com o campesinato.

Segundo Bukharin, o rompimento com o campesinato provocaria um trauma irreparável. O Estado tenderia a se ampliar de forma desmesurada e isto seria "menos racional" do que a estrutura anárquica de produção de mercadorias. Mesmo porque o mercado, desde que submetido a controles, era mais sensível às demandas dos consumidores do que um Estado supercentralizado. Bukharin argumentava que os consumidores eram a razão de ser da economia soviética. A perspectiva de construção do socialismo partia, assim, do mercado e evoluía, sem negá-lo de forma absoluta, mas subordinando-o, crescentemente, em direção a formas coletivas.

Mas infelizmente a burocracia já existente e a própria cultura do bolchevismo não permitiram que essa política fosse consolidada. Então em 1928, Stalin promoveu uma 'guinada esquerdista', adotando a coletivização forçada no campo e a completa estatização da economia, restabelecendo dessa forma a política equivocada de construção do socialismo por decreto. Com isso foi promovido um verdadeiro massacre no campo, onde morreram mais de 10 milhões de camponeses, seja em virtude da repressão ou pela fome. O campesinato acabou regredindo a condição de servidão, o que acabou promovendo a ruptura definitiva da aliança operário-camponesa, levando o partido comunista a se afastar das massas populares e a burocracia se consolidar no poder absoluto.

Esses dois fatores, ausência de democracia política e completa estatização da economia, constituem a base da burocratização do Estado soviético, e consequentemente dos demais Estados que seguiram esse modelo, o que levou a derrota da primeira experiência de construção do socialismo.

O socialismo não pode ser construido por decreto, precisa ser construido processualmente, como a própria história comprova ao observarmos o sucesso da Nova Política Economica, adotada entre 1921 e 1928. Uma economia mista, onde o mercado e a planificação democrática da economia coexistem, com a propriedade coletiva ou social sendo implementada nos setores estratégicos, enquanto a pequena e média propriedade privada continuam funcionando em outros setores, sobre a regulação do Estado proletário.


A esquerda precisa romper com a herança stalinista, abandonando o fetiche pelo estatismo. O mercado e a propriedade privada devem coexistir com a planificação e com a propriedade social na futura sociedade socialista por um bom tempo, principalmente na sua fase inicial.


"O socialismo não pode, nem deve eliminar o mercado de imediato. Precisará conviver com o mercado e tirar proveito dele durante um tempo certamente longo. Só que, para ser compatível com o socialismo, precisará ser um mercado regulado, direcionado pelo planejamento do Estado e refreado no que se refere aos aspectos socialmente negativos." (Jacob Gorender; em Teoria e Debate nº 16)

Um comentário:

  1. só não entendo uma coisa. Por que o estado socialista deve interferir na economia ? por apenas não dinamizar a economia com a socialização dos meios de produção e se ater apenas na eliminação da exploração do homem pelo homem ? não vejo nenhum proveito no engessamento da economia.

    ResponderExcluir