"Ser marxista é, antes de mais nada, ser anticapitalista, ou seja, lutar pela construção de uma sociedade sem classes, que suprima a exploração do homem pelo homem e a propriedade privada dos grandes meios de produção, criando condições para que as relações entre os homens sejam fundadas na solidariedade e não no egoísmo do mercado. Claro, ser marxista não é repetir acriticamente tudo o que Marx disse. Marx morreu há cerca de 120 anos e muita coisa ocorreu desde então. Mas, sem o método que ele nos legou, é impossível compreender o que ocorre no mundo. Ele nos disse que o capital estava criando um mercado mundial, fonte de crises e iniqüidades, e nunca isso foi tão verdadeiro quanto no capitalismo globalizado de hoje. Falou também em fetichismo da mercadoria, na conversão do mercado num ente fantasmagórico que oculta as relações humanas, e nunca isso se manifestou tão intensamente quanto em nossos dias, quando lemos na imprensa barbaridades do tipo 'o mercado ficou nervoso'." (Carlos Nelson Coutinho)

sábado, 21 de abril de 2012

O autoritarismo de Trotsky


O revolucionário bolchevique Leon Trotsky, era o mais conhecido opositor do stalinismo. Expulso da URSS em 1929, fundou um movimento comunista dissidente, a IV Internacional. Acabou sendo assassinado por um agente stalinista em 1940, no México, onde estava exilado.

Trotsky acusava Stalin de ter traido a revolução, ao impedir sua expansão para o resto da Europa e por ter burocratizado o Estado soviético, transformando o socialismo em uma caricatura, onde a burocracia era uma casta privilegiada que oprimia o proletariado, agindo como uma nova classe dominante. Pois bem, também sou anti-stalinista e concordo que Stalin traiu a revolução, entretanto não vejo como a revolução podia ser expandida para o resto da Europa, com a Rússia arrasada em consequência da Primeira Guerra Mundial, Guerra Civil, e pelo fracasso da política do "comunismo de guerra", adotada pelos bolcheviques entre 1918 e 1921. E mais, a revolução foi derrotada na Hungria e na Alemanha, portanto não havia como a Revolução Russa se expandir. Stalin foi realista ao defender a política do "socialismo em um único país", até porque outras revoluções acabaram ocorrendo, como na Mongólia em 1924, e na China em 1949. E após a Segunda Guerra Mundial, o socialismo foi estabelecido em todo leste da Europa e na Coréia do Norte.

O problema do socialismo soviético não foi a política do "socialismo em um único país", e sim a subordinação do movimento comunista internacional a URSS, eliminando o internacionalismo proletário. Em nome da segurança da URSS, durante a Guerra Civil Espanhola, os comunistas sufocaram os revolucionários anarquistas e o POUM, que lutavam por uma revolução socialista na Espanha, enquanto os comunistas lutavam pela defesa da república, temendo que ingleses e franceses se aliassem ao nazi-fascismo, caso ocorrese a revolução na Espanha. E mais, a burocratização do Estado soviético foi consequência da equivocada decisão de construir o socialismo por decreto, coletivizando a força as terras, colocando o campesinato contra o proletariado, dividindo assim as classes populares e afastando o partido comunista das massas populares, que eram majoritariamente camponesas. Essa política adotada por Stalin em 1928, quando acabou com a Nova Política Economica(NEP, na sigla em inglês) e adotou a coletivização forçada da agricultura e a industrialização acelerada nas cidades, também era defendida por Trotsky. Portanto a oposição trotskista ao stalinismo é pura hipocrisia, ambos são farinha do mesmo saco e representam a mesma visão autoritária e burocratizada de socialismo.

"A discussão em torno do papel do Estado, sua relação com os sindicatos, a autonomia da classe operária, nada disso fora palavrório oco. Lênin, com a NEP, propunha agora um outro caminho, com maior liberdade para a cidade e o campo, recuperando o papel do mercado, compreendendo que o capitalismo ainda tinha fôlego para se desenvolver numa sociedade que ele acreditava estar caminhando para o socialismo. Trotsky tinha outra visão, que mais tarde, ironicamente, será integralmente adotada por seu mais visceral inimigo, Stalin. Está certo Deutscher quando afirma não haver praticamente nenhum aspecto do programa sugerido por Trotsky em 1920-21 que Stalin não tenha usado durante a industrialização acelerada da década de 1930. Adotou o recrutamento forçado, subordinou os sindicatos, estimulou a disputa de produção entre os trabalhadores, na linha do taylorismo soviético defendido por Trotsky." (Emiliano José; em "Trotsky: do pomar para a Revolução")  


 Lênin criticou as posições autoritárias de Trotsky, apresentadas em 1920/1921, que incluiam até mesmo a militarização do trabalho e a estatização dos sindicatos.

"Trotsky foi o principal defensor da fusão dos sindicatos ao Estado e, inclusive, a sua militarização. Ele aplicou seus métodos "revolucionários" quando foi responsabilizado pela reorganização dos serviços de transporte. Assumindo o controle absoluto do Comitê Central de Transporte, decretou imediatamente "estado de emergência" nas ferrovias, destituiu os dirigentes eleitos dos sindicatos e colocou todos os operários sob lei marcial.

Em 16 de dezembro de 1919, Trotsky apresentou no Comitê Central do Partido Bolchevique a sua tese "Sobre a transição entre a guerra e a paz", na qual reafirmou a necessidade de militarização dos sindicatos russos. Ele defendeu novamente as suas posições no IX congresso do PCRb. Na ocasião afirmou ele: "As massas trabalhadoras não podem vaguear através da Rússia. Devem ser enviadas para aqui e para ali, nomeadas, comandadas exatamente como soldados (...) O trabalho obrigatório deve atingir a sua maior intensidade durante a transição do capitalismo para o socialismo (...) É preciso formar patrulhas punitivas e pôr em campos de concentração os que desertam do trabalho". E concluiu: "O Estado Operário possui normalmente o direito de forçar qualquer cidadão a fazer qualquer trabalho em qualquer local que o Estado escolha."

Contra as posições autoritárias de Trotsky, Lênin escreveu os artigos "Sobre os Sindicatos, o momento atual e os erros de Trotsky" e "Mais uma vez sobre os sindicatos, o momento atual e os erros dos camaradas Trotsky e Bukharin". Afirmou ele: "os sindicatos são uma organização da classe dirigente, dominante e governante. Mas não são uma organização estatal, não são uma organização coercitiva, são uma organização educadora, uma organização que atrai e instrui, são uma escola, escola de governo, escola de administração, escola de comunismo". Portanto, não poderiam ser transformados em quartel ou prisão.

Lênin negou a tese trotskista de que a defesa dos interesses materiais e espirituais da classe operária não deveria ser de incumbência dos sindicatos em um Estado operário. Para ele isto era um grave erro. Afirmou Lênin: "O camarada Trotsky fala de 'Estado operário'. Permitam-me dizer que isto é pura abstração (...) comete-se um erro evidente quando se diz: Para que e ante quem defender a classe operária, se não há burguesia e o Estado é operário? Não se trata de um Estado completamente operário, aí está o xis do problema (...) Em nosso país, o Estado não é, na realidade, operário, e sim operário e camponês (...) Porém há mais alguma coisa (...) nosso Estado é operário com uma deformação burocrática (...) Pois bem, será que diante desse tipo de Estado (...) nada têm os sindicatos a defender? Pode-se dispensá-lo na defesa dos interesses materiais e espirituais do proletariado organizado em sua totalidade? Essa seria uma opinião completamente errada do ponto de vista teórico (...) Nosso Estado de hoje é tal que o proletariado organizado em sua totalidade deve defender-se, e nós devemos utilizar estas organizações operárias para defender os operários em face de seu Estado e para que os operários defendam nosso Estado".

Lênin criticou também a pretensão de Trotsky em transformar o modelo de organização das ferrovias durante a guerra civil em um modelo de organização dos sindicatos durante todo o período de construção do socialismo. Escreveu ele: "Na resolução do I Congresso do PC de Toda Rússia, em abril de 1920, dizia que a Seção Política Geral do Comissário do Povo de Vias de Comunicação era criada na qualidade de instituição 'temporária', e que 'no prazo mais curto possível' era necessário passar à normalização da situação. Em setembro, lia-se, 'passemos à situação normal'". Continuou: "em que consistiu o erro da Seção política Geral do Comissariado do Povo de Vias de Comunicações e do Comitê Central do Sindicato de transporte? (...) Seu erro foi não saber passar, em tempo e sem conflitos, segundo exigia o IX Congresso do PCR, para um trabalho sindical normal."

Lênin também viu com reservas a proposta de se utilizar, como método permanente, a indicação de dirigentes sindicais pelos órgãos superiores do Partido e do Estado soviético. Concluiu: "A organização dos sindicatos a partir de cima seria absolutamente ineficaz. Os métodos de uma democracia operária, severamente restringidos nos três anos da mais selvagem guerra civil, devem ser restabelecidos, em primeira instância e na mais ampla escala possível, no movimento sindical. É necessário aos órgãos dirigentes dos sindicatos serem, na realidade dos fatos, constituídos por eleições e sobre uma ampla base"".

(Augusto César Buonicore; em "Lênin, os sindicatos e o socialismo")


 Por isso afirmo que o trotskismo não é alternativa para o stalinismo, mas sim o outro lado da mesma moeda. Os marxistas que defendem a luta do proletariado para derrubar o capitalismo e construir uma nova sociedade, onde não mais exista a exploração do homem pelo homem, devem romper com o stalinismo e também com o trotskismo, buscando resgatar o melhor do pensamento marxista, segundo a realidade da luta de classes no século XXI.

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